E se recheássemos a vida com fanfaní?
O que acontece quando uma mulher sai da rota cuidadosamente desenhada pela repetição e se alinha com seu Nodo Norte.
Te confesso que não sei.
Não sei se esse bálsamo começou a ser produzido segunda-feira pela manhã, sexta da semana passada, em algum mês de dois mil e onze, em algum mês de dois mil e vinte e seis ou lá no comecinho da década de noventa quando essa mulher selvagem que hoje vos escreve era uma menina moleca que vivia na zona rural de uma cidadezinha no interior de Minas e passava horas das suas vagarosas tardes amassando barro e fazendo bolinhos de terra cuidadosamente enfeitados com pedrinhas e florzinhas para vender pros pais em troca de dinheiro feito de folha e uns “yummy yummy, aí que delícia de bolinho filha.”
Mas independente de onde essa história começa, uma coisa é certa: se engana quem ainda acredita que o Tempo se move de forma linear, acha que passado, presente e futuro são três tempos distintos e acredita que memórias só falam de algo que já aconteceu, sonhos só falam de algo que pode vir a acontecer e que o Presente é o único lugar onde conseguimos no agora estar.
Depois de dar algumas tantas necessárias voltas terminarei esse bálsamo multiplicando afeto ao dividir com você um convite mais que especial e uma receita simples que está na terceira página do meu caderno de receitas desses no estilo Dona Benta, escrito a mão e estampado com pingos de óleo e marcas de dedo sujo de massa de bolo - um tesouro que estava soterrado sob uma pilha de livros de auto ajuda que pouco me ajudaram e que ficou esquecido no tempo até eu ser pela
, uma das escritoras integrantes do meu clube, despertada para a delícia das tardes vagarosas com cheiro de bolo recém saído do forno e gosto de vida doméstica vivida com propósito.Essas tardes vagarosas que acontecem inerentes ao tempo que corre no relógio, que nos fazem esquecer que a palavra pressa segue existindo dentro e fora do dicionário e definindo o ritmo no qual muito gente ainda escolhe se sincronizar, ainda existem.
Mas ao que tudo indica, para vivê-las não basta só deixar fluir é preciso manualmente, via consciência, adicionar à vida um ingrediente especial que não é facilmente encontrado nas prateleiras abarrotadas de produtos que esse mundo moderno produz.
O tal do Fanfaní.
Mas para falar desse ingrediente que você não conhece de nome mas que certamente conhece o sabor, eu precisarei te levar de volta para um sonho que vive no meu passado e uma memória que habita o meu futuro e costurar uma breve história sobre o meu presente que, segundo a minha intuição, há de ecoar forte aí nesse seu peito cansado da sensação de que em meio a sua busca por viver o seu propósito, o tempo está passando rápido demais e levando com ele a nossa capacidade de nos encantar pelo ordinário.
Se ele está? Eu acredito que não.
Encantamento não é um qualidade que pode de nós ser tirada. Encantamento é um músculo e tal qual os outros músculo do Corpo, precisa ser exercitado se não acaba atrofiando.
Mas ainda que atrofiado, segue existindo.
Como de costume, te aconselho a pegar um algo gostoso para bebericar e vir bem vagarosa, deixando a pressa bem presa dentro do dicionário para conseguir desfrutar devagarinho da medicina que cada linha e entrelinha desse bálsamo contém.
Eu já tive um blog.
Ou melhor, eu já tive blog de culinária.
E o nome do meu blog, que ainda vive numa ilha remota da internet que já não está mais na rota de navegante nenhum mas que segue boiando sem afundar e desaparecer nesse oceano cibernético, era Pão com Fanfaní.
Lá no Pão com Fanfaní eu, aos 21 anos de idade, com uma escrita que hoje me parece trêmula, inocente e um tanto doce demais pro meu gosto atual que tá mais pro doce pero no mucho, já escrevia sobre um viver vagaroso.
surpresa. surpresa.
Naquela época, além de escrever um blog e compartilhar receitas eu também escrevia o meu primeiro casamento, que durou três anos e terminou meses antes de’u me mudar para a Irlanda, e construía a minha carreira de bailarina que durou nove e que também terminou meses antes de’u me mudar para cá em maio de dois mil e quatorze, com uma única mala em mãos a três desejos no peito: aprender inglês, viajar o mundo e descobrir a mulher que eu era para além de uma carreira, uma relação fracassada e da minha doçura.
Eu não trouxe comigo nem a dor de um divórcio nem uma boa dose de Fanfaní.
Coloquei na mala os poucos pertences que sobraram depois de ter vendido quase tudo que eu tinha e vim literalmente leve, livre e solta. Desembarquei sozinha puxando com uma mão essa uma mala de rodinha e segurando na outra meu passaporte, a carta da escola de inglês e um pedaço de papel com o endereço da família irlandesa que me hospedaria durante o primeiro mês de intercâmbio.
A minha missão era só uma:
conseguir passar pela imigração sem falar um a de inglês e encontrar um taxi. Simples!
Mas para a minha total surpresa, no salão de desembarque duas criaturas estavam a me esperar.
Já imagina quem elas sejam, né?
Meu coração partido e terrivelmente dolorido e um pacote generoso de Fanfaní.
Ao longo desses dez anos de Irlanda, te conto que meu coração foi não só remendado como também se abriu uma vez mais para acreditar na comunhão de dois, na escolha de uma parceria para a vida e para o surfe cheio de altos, baixos, cristas de onda e afogamentos que é uma relação de muitos anos.
E depois de uma longa e dolorida crise onde eu estive por mais de um ano vislumbrando um segundo divórcio no meu horizonte aqui estou eu, casada, com a minha aliança que esteve guardada numa gaveta outra vez na mão esquerda, grávida desse homem que há oito anos diariamente escolhe construir a vida comigo e, como ele mesmo diz naquele sotaque polonês acentuado dele, be a team - ser um time, escolhendo pela primeira vez na vida não simplesmente escrever a nossa relação e a criação da nossa pequena família poliglota de três, mas prioriza-las e colocá-las antes, muito muito muito antes, da minha independência e realização profissional que nessa e em outras tantas encarnações foi a bússola que orientou a evolução da minha alma.
E é exatamente aqui que o subtítulo dessa publicação começa a fazer algum sentido.
O meu conhecimento sobre astrologia é limitado e até bem pouco tempo se resumia a saber o meu signo solar, meu ascendente, minha lua, minha vênus e ter algumas outras poucas informações sobre o meu mapa astral memorizadas.
A vida toda eu desconheci o meu Nodo Sul e Nodo Norte. E se você desconhece os seus, eu te aconselho a largar esse bálsamo pela metade e ir agora mesmo descobrir essa preciosa informação, principalmente se você é do clube das mulheres que buscam viver o seu propósito mais do que desfrutar de uma vida com propósito.
Mentira, deixa para fazer isso depois!
Continue lendo.
Quando eu digo que tem sonho que vive no passado e memória que vive no futuro, me vem a cabeça uma das memórias mais vívidas que eu tenho de outras vidas e que nesses 34 anos de vida eu estive projetando no meu futuro.
A de uma Verbena famosa.
Não famosa no estilo celebridade que estampa capa de revista Caras e viaja de jatinho para Fernando de Noronha no fim de semana, e sim famosa no estilo amplamente reconhecida, premiada e enaltecida pelo meu trabalho sem necessariamente muito glamour.
Aquilo que até então vinha sendo visto como uma ambição, um sonho a ser realizado nesses anos de vida adulta através de muito trabalho, dedicação, insistência e certamente um pouco de sorte, no momento que eu descobri o meu Nodo Norte, que é a direção na qual o processo de evolução da nossa alma nos convida a seguir, passou a ser visto como uma memória de algo que eu já vivi repetidas vezes em outras encarnações.
Porque o meu Nodo Sul, que é aquilo que a nossa alma já viveu, já realizou e já saturou em vidas passadas e que a nossa tendência é repetir nessa vida até enfim nos conscientizarmos do nosso Nodo Norte e a ele nos alinharmos, é em Leão e na casa dez que é a casa do trabalho; o meu lugar conhecido de outras vidas e a minha grande tendência nessa encarnação é viver no modo workholic, dedicando o suprassumo da minha energia vital ao trabalho e a realização pessoal pela via profissional, colocando a minha arte na frente de tudo e todos e dedicado tempo, atenção e nutrição a tudo que envolve ser profissionalmente bem sucedida.
Em outras tantas vidas, eu deixei de estar no meu lar para cuidar do meu sucesso, não participei dos afazeres domésticos e das micro e grande conquistas dos meus filhos e parceiros para perseguir e viver as minhas realizações individuais que me levaram a lugares de muito reconhecimento, fugi dos desafios e dramas da vida doméstica e familiar me soterrando em horas e horas e horas de trabalho e criação compulsiva.
Nessa vida, minha velha alma veio escrever outra história e viver novos desafios.
E ainda que o meu Nodo Norte seja em Aquário, o que propõe uma dedicação a causas humanitárias, o que eu estou finalmente aprendendo é que aqueles que dormem do nosso lado na cama ou logo ali no berço no quarto ao lado também são parte da humanidade, e que nos dedicar a essa humanidade que tá pertinho não é um trabalho nem um pouco menos importante do que as grandes causas coletivas do nosso tempo.
E por que eu estou te contando tudo isso?
Porque independente de onde o seu Nodo Sul e Norte estejam, as chances são bem grandes de que você também anda optando por cuidar das causas coletivas e da expressão da sua arte enquanto sacrifica a sua vida pessoal e o tempo dedicado ao puro deleite de viver a vida doméstica e simplesmente estar, com uma presença radical, com aquela parte da humanidade chamada família e amigos.
E porque eu tô fazendo essa suposição?
Por que eu tenho a curiosa habilidade de magnetizar e trazer para perto, pelo menos aqui no digital, mulheres ardentes cheias de sonhos, desejos e grandes ambições profissionais, super talentosas, comprometidas e dedicadas, que tendem a colocar toda a sua energia criativa e de criação, ou pelo menos o suprassumo delas, no trabalho e esquecer de nutrir as outras tão importantes áreas da vida.
Que fique bem claro que esse bálsamo não tem o intuito de te convencer a abandonar suas ambições, desistir da sua arte e te vender a idéia de que cuidar do lar e da família nos basta.
Muito pelo contrário.
Ao me alinhar com o meu Nodo Norte, apontar a minha caminhada rumo a realização pessoal para muito além da realização profissional e colocar a humanidade que dorme ao meu lado antes dos outros mais de 8 bilhões na minha lista de prioridades, eu não estou me fazendo menos escritora ou tirando a importância da minha criação artística eu só estou reorganizando o meu presente e alinhando ambos, o meu trabalho e a minha expressão artística, com o propósito evolutivo da minha velha alma, que ao que tudo indica é viver uma vida vagarosa, divertida, menos séria e menos preocupada com o sucesso financeiro e profissional, generosa em tempo livre para estar com os meus e celebrar as conquistas deles mais do que as minhas, e através desse jeito irreverente e autêntico de viver uma vida simples, inspirar as pessoas a simplificarem a vida e encontrem no micro e no mundano, o deleite, o encantamento e a magia de se estar radicalmente vivo.
E por falar em magia, lembra do tal do Fanfaní?
O ingrediente especial que estava no título do meu blog e me esperando no aeroporto?
Pois então, Fanfaní é uva-passa.
Ou melhor, fanfaní é a palavra que eu usava quando queria que meu pai colocasse uva passa na massa dos pães integrais que ele fazia.
Bebené qué pão com fanfaní - eu dizia.
Bebené era como eu me chamava quando ainda não sabia falar o meu próprio nome e é, até hoje, o apelido carinhoso pelo qual minha irmã e meus irmãos me chamam.
Para aquela menina, fanfaní eram as micro bolinhas pretas cheias de sabor que transformam o pão integral normal de todo dia em um pão mágico, diferente, com surpresas interativas; porque claro antes de comer a minha fatia de pão com fanfaní eu tirava com a ponta do dedo cada um dos fanfanís da massa enquanto me admirava dos buraquinhos que ficavam no lugar.
O café da manhã e da tarde eram transformados pela adição de fanfanís na massa do pão.
Hoje em dia os meus fanfanís são outros:
uma generosa colher de geléia de damasco que eu coloco em cima de um muffin de chocolate recém saído do forno que juntos transformam uma tarde qualquer em um momento mágico;
uma generosa colher de manteiga de amêndoa que eu coloco no meu mingau de aveia que é o meu café da manhã favorito durante o inverno;
o creme de manteiga de karité que eu tenho passado na minha barriguinha de grávida todas as noites depois do banho enquanto troco idéia com o meu pacotinho de vida e espero ele me chutar e me contar os causos da vida uterina;
as publicações escolhidas a dedo que eu leio aqui no Substack que me levam para cantos sagrados do meu mundo interior me convidando a expandir, descansar e suavizar cada vez mais;
as mensagens carinhosas e cheias de insights que eu troco com as integrantes da assinatura paga do meu cafofo e as visitas ao painel de controle da minha publicação que já me mostram que a recente decisão de abandonar o navio naufragante que é o Instagram para recomeçar aqui sem 12 mil seguidores já está se mostrando radicalmente acertada;
as horas vividas na cozinha rindo alto, picando ingredientes e cozinhando com o meu marido os nossos jantares de meio da semana que costumam ser um banquete de reis regado a vinho (e água de coco na taça pra mamãe que além de descafeínada anda desalcolizada e desejosa de coisas refrescantes);
.. e a lista continua.
Fanfaní é aquele ingrediente mágico que ao ser adicionado ao cotidiano nos tira da normalidade de cada dia e torna a nossa rotina um tanto mais especial, são os micro rituais que modificam a mesmice e que fazem com que cada dia seja um novo dia ao invés de só mas um dia num calendário que passa acelerado; é tudo aquilo que transforma a experiência ordinária do presente em uma vivência extraordinária e que nos mostra que independente de para onde o nosso propósito de vida nos levará, uma vida com propósito é possível de ser vivida exatamente onde estamos.
Te deixo por aqui, sem grandes conclusões mas com dois fanfanís para te presentear.
Esse aqui é para ser desfrutado numa tarde vagarosa que você sentir de perfumar com cheiro de bolinhos de chocolate recém saídos do forno.
E o outro estará disponível a partir de Quarta aqui na seção Publique-se e é para quando você decidir que é chegada a hora de tirar aquele sonho de ter um blog da gaveta e criar um cafofo aqui no Substack para chamar de seu; ou para quando você decidir que é chegada a hora de dar um salto com o sua já existente publicação e começar a transformar as suas histórias, sonhos, memórias, desejos e anseios em medicina-escrita para esse mundo tão mais precisado de humanos vulneráveis do que de auto-intitulados experts da porra toda.
Desfrute, vagarosamente.
com um afeto radical,
Verbena Cartaxo
Tá difícil encontrar palavras para descrever esse bálsamo. Na segunda eu escutei, precisei processar durante a semana, e hoje eu li.
E ainda sem saber muito o que dizer, agradeço. Agradeço por me mencionar, por me levar para lugares tão mágicos dentro de mim, e por me lembrar de que sim, gostamos de profundidade, áudios e textos longos e uma vida plena de significado.
Ps1: amei o blog, ainda que doce.. ❤️
Ps2: fui correndo relembrar meus nodos norte e sul, que estão em Touro e Escorpião. Bastante coisa para refletir aqui..
Beijos e abraços apertados ❤️❤️❤️
mulher, eu não sei em que bolha energética estamos envoltas, mas parece que conversamos sobre a vida e nesse bálsamo você me trouxe as respostas que busquei a semana toda. esse assunto foi pauta por aqui e está alugando um bom espaço na minha mente e alma. meu nodo sul é câncer e o norte é caprica. a carreira é algo importante pra mim nesta vida, mas como bem me lembrou minha amiga Ananda, carreira não é só essa correria alta performance que nos vendem. é o meu legado, na verdade! e tenho refletido muito sobre que pegada eu desejo deixar por aqui. e o que me preenche a alma é essa medicina feminina de cura que nós estamos vagarosamente cozinhando e servindo. esse bálsamo cumpriu seu papel por aqui. eu li o tempo todo com um sorriso no rosto e a certeza de que o universo me respondeu através das suas palavras e da sabedoria da Bebené! te agradeço e te abraço!